Por que as flores que crescem na calçada são fascinantes, segundo a ciência
Tanto na primavera quanto no verão, flores surgem espontaneamente em gramados, campos e até em rachaduras na calçada. Mas o que você vê quando olha pra elas: ervas daninhas ou flores urbanas?
Pode ser um pouco frustrante ver flores silvestres crescendo na rua. Como elas ficam tão bonitas, enquanto as flores do seu jardim demoram tanto a desabrochar? A resposta mais simples é: elas são selvagens.
Por milhões de anos, elas tiveram que se virar com o sol, o solo e a chuva que a natureza fornecia. Uma semente levada pelo vento pousa em algum lugar e tenta germinar, mas se as condições não forem favoráveis, ela não sobreviverá por muito tempo. Por isso, muitas flores silvestres evoluíram para produzir milhares de sementes (como a papoula, o cardo rasteiro, a cenoura selvagem e a urtiga-roxa).
Um dente-de-leão (Taraxacum officinale) produz até 200 sementes por flor e, em média, 15.000 sementes por planta. Em um campo aberto, cerca de um quarto (3.750) das sementes caem em um local adequado e têm os genes certos para germinar e crescer.
Uma mudança de paradigma na pesquisa está revolucionando a forma como os cientistas veem as plantas: elas são muito mais complexas e mais parecidas conosco do que se imagina.
Este florescente campo da ciência é fascinante demais para ser resumido em uma ou duas histórias. Este artigo faz parte de uma série, “Curiosidade pelas Plantas”, que explora estudos científicos que desafiam a forma como você vê a vida vegetal.
Lar é onde está a parede
Algumas plantas adquiriram táticas mais elegantes para garantir que sua prole tenha sucesso. A semente de um dente-de-leão vai para onde o vento ou o sopro de uma criança a levar. Já a cymbalária-das-paredes (Cymbalaria muralis) é um pouco mais cuidadosa. Crescendo na parede, suas pequenas flores de cor lilás-azulado e amarelo voltam-se para a luz do sol, chamando a atenção de uma abelha ou de uma mosca-da-flor que passa.
Uma vez polinizada, e a cápsula com sementes começa a se desenvolver, a flor se afasta da luz. Em seguida, empurra a cápsula para dentro de uma fenda na parede. Essas fendas são o lugar perfeito para que as sementes cresçam. Uma parede pode não parecer um lugar particularmente fértil, mas, com o tempo, o vento e a chuva fazem com que sujeira e nutrientes fiquem presos nos poros. Isso é todo o solo de que a cymbalária-das-paredes precisa.
Forte, independente e generosa
Manter um gramado perfeitamente verde e uniforme é uma tarefa difícil e prejudicial ao meio ambiente, pois eles não oferecem nenhum habitat para polinizadores, entre outras razões. Campos de jogos e outros espaços públicos não recebem muita manutenção, mas misteriosamente o solo permanece verde.
Aqui, muitas vezes o trevo-branco (Trifolium repens) e o trevo-vermelho (Trifolium pratense) assumem o trabalho do jardineiro. Essas plantas são a definição de fortes e independentes. Os trevos são resistentes à seca, mantêm a umidade do solo e o fertilizam.
Para fertilizar o solo, os trevos criam pequenos nódulos em suas raízes, que são o lar perfeito para as bactérias do gênero Rhizobium. A planta oferece às bactérias um bom lugar para viver, enquanto elas fornecem nitrogênio à planta.
O trevo compartilha esse nitrogênio com as plantas vizinhas através de suas raízes e de uma vasta rede de fungos no solo. O trevo não só mantém o gramado verde, mas também fornece néctar para polinizadores, como abelhas, borboletas e mariposas.
As flores silvestres são multitarefa. Elas são uma fonte de alimento para os insetos amigáveis da vizinhança, mas também beneficiam o solo.
O dente-de-leão fornece néctar para mais de 187 espécies diferentes de abelhas selvagens. Flores como dente-de-leão, cardo (Cirsium sp.), papoula (Papaver rhoeas) e chicória (Cichorium intybus) desenvolvem raízes pivotantes que penetram profundamente no solo e ajudam a planta a sobreviver em condições adversas, como a seca.
Diferentes flores silvestres desenvolvem diferentes tipos de raízes. Juntas, essas raízes criam um ótimo ambiente para a vida subterrânea, incluindo bactérias, fungos e animais maiores. Esses organismos aeram o solo, o que melhora a regulação da água. Dessa forma, o solo pode absorver mais água, e suas poças irão drenar mais rapidamente após uma forte chuva. Essas plantas prestam muitos serviços invisíveis ao seu próprio ecossistema.
Mas você consegue reconhecer e nomear as flores urbanas?
As pessoas costumavam comer todos os tipos de flores silvestres ou usá-las como remédio. Por exemplo, as papoulas eram, e ainda são, usadas como medicamento para tosse e sedativos. Você ainda pode comprar pó de raiz de chicória como um substituto sem cafeína para o café.
As flores silvestres também têm feito parte do nosso patrimônio cultural. Na Era Vitoriana, elas eram usadas como presentes para expressar sentimentos ou mensagens secretas. Papoulas eram um sinal de prazer, margaridas (Bellis perennis) proclamavam inocência, urtigas (Urtica dioica) denunciavam escândalos e centáureas (Centaurea cyanus) eram símbolos do amor.
Mas estamos perdendo a consciência do mundo vivo ao nosso redor. O termo científico “cegueira botânica” descreve nossa incapacidade de notar as plantas ao nosso redor. Em um estudo realizado no Reino Unido em 2010, estudantes adolescentes foram convidados a reconhecer e nomear dez flores silvestres comuns, mas a grande maioria não conseguiu nomear mais de três flores.
No entanto, nunca foi tão fácil aprender sobre plantas. Aplicativos que reconhecem plantas através da câmera do celular estão amplamente disponíveis. Algumas pessoas estão até tentando compartilhar seu entusiasmo por flores silvestres nas ruas através de “desenhos botânicos com giz” – desenhando um círculo em volta de uma planta na calçada e escrevendo seu nome com giz.
Da próxima vez que vir flores crescendo através do pavimento, que tal parar para dar uma olhada, em vez de simplesmente passar por essas flores silvestres resilientes e belas?
Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site The Conversation, e escrito por Nienke Beets, doutoranda do Departamento de Botânica e Comunicação Científica, na Universidade de Leiden, dos Países Baixos.