Assim como os povos indígenas, as abelhas melíponas – espécies nativas desprovidas de ferrão, já residiam no Brasil antes mesmo de 1.500, quando as caravelas portuguesas aportaram no litoral do que é, hoje, o estado da Bahia. Contudo, mesmo com moradia pra lá de centenária em solo tupiniquim, a meliponicultura é uma atividade pouco conhecida pela maioria dos brasileiros, visto que a maior parte da produção de mel advém das abelhas Apis melliferas ou africanizadas, um cruzamento das abelhas Apis, da Europa e da África.
Formada em zootecnia e tendo a apicultura como paixão, a servidora da Agraer (Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural), Jovelina Maria de Oliveira, propôs apresentar aos agricultores familiares a vertente da meliponicultura dentro da Tecnofam – Tecnologias e Conhecimentos para Agricultura Familiar, realizada na Embrapa Agropecuária Oeste, de 17 a 19 de abril de 2018.
Jovelina Maria de Oliveira apresentou aos agricultores familiares sobre a meliponicultura |
“A Apis mellifera tem o seu valor. Porém, a meliponicultura também tem o seu valor tanto econômico como o nutricional. E o interessante de apresentarmos este trabalho na Tecnofam é que as pessoas podem se aproximar das colmeias sem nenhum medo e sem a necessidade de colocar uma roupa de proteção”, observa Jovelina.
Na bancada da zootecnista é possível conferir o comportamento das abelhas através das colmeias artificiais feitas à base de madeira. “Há um vidro em cada caixinha [colmeia] que as pessoas podem ver enquanto eu explico um pouco do comportamento de cada espécie”.
Marmelada, Moça Preta, Jataí ou Jati, Mirim, Manduri e Mandaçaia são as espécies de abelhas sem ferrão expostas dentro do eixo Tecnologia a Campo, na 3ª edição da feira. Uma das grandes vantagens do mel desse tipo de abelha refere-se ao seu menor teor de açúcar em relação ao da Apis .
O mel dessas abelhas também possui um grande valor medicinal. Sabe-se que ele possui, também, uma elevada atividade antibacteriana sendo usado contra doenças pulmonares, resfriado, gripe, fraqueza, e infecções de olhos. “Costuma-se dizer que a melhor espécie de abelha é a que produz mel, ou seja, todas as espécies com ou sem ferrão tem o seu nível de importância. Mas, aqui, queremos ressaltar algo que faz parte das nossas raízes desde muito tempo e que tem sua viabilidade produtiva”, enfatiza a zootecnista.
Além das colmeias, os visitantes têm a oportunidade de degustar algumas variedades de mel para conferir no paladar a característica de cada um. Dentre os pequenos potes expostos um dos que mais chama a atenção é o mel de jandaíra devido a sua coloração.
“Eu trouxe mais para conhecimento das pessoas mesmo. O foco são as abelhas sem ferrão de Mato Grosso do Sul. Mas, o gosto do mel da jandaíra é bem agradável também e a cor chama a atenção de quem passa, pois aqui não é muito conhecido”, diz.
A jandaíra é uma espécie de abelha do bioma da Caatinga (que ocorre exclusivamente no Brasil), nas terras secas do semiárido, e distribui em estados como Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Jovelina ainda destaca pontos que vão além da sua participação na Tecnofam. “Pela Agraer eu participo de um grupo que discute a necessidade de se ter uma câmara setorial de meliponicultura. Precisamos formular uma lei que trate sobre esse eixo, pois a lei nacional trabalha sobre o mel de forma generalizada. Há características peculiares de cada tipo de abelha, com e sem ferrão”, argumenta.
A ideia é estabelecer uma lei que facilite a comercialização do mel de abelhas sem ferrão e, ainda, traga melhores garantias de preservação das espécies. “Em fevereiro, a Bahia aprovou um projeto de lei e, queremos fazer o mesmo. Com isso a gente fortalece a cadeia produtiva desse tipo de mel e fomenta a renda dos meliponicultores. Apicultor é somente quem trabalha com as abelhas Apis, os que trabalham com as sem ferrão são chamados de meliponicultores”, observa Jovelina.
Uma lei desse tipo facilita execução de pesquisas científicas, educação ambiental, implantação de meliponários, conservação, exposição, reprodução e comercialização das abelhas, produtos e subprodutos, tais como: mel, pólen e própolis, sejam para o consumo doméstico ou para o comércio dentro de Mato Grosso do Sul.
Na história do Brasil – As abelhas nativas ou abelhas sem ferrão (ASF) já viviam no Brasil muito antes das espécies estrangeiras chegarem aqui. As melíponas povoam diversos biomas do território brasileiro com mais de 300 espécies.
A meliponicultura é uma atividade de criar abelhas deste grupo, diferindo da apicultura que é a atividade de criação das abelhas Apis mellífera, popularmente, conhecidas como “europeias” ou “africanas”.
Por volta do século XVIII os jesuítas trouxeram abelhas da Europa do tipo Apis para o Brasil. O objetivo era produzir cera para as velas usadas nas missas. Na década de 1.950 pesquisadores da Unesp trouxeram para o interior de São Paulo algumas abelhas da África, também do tipo Apis, que tinham bastante produtividade. Contudo, algumas abelhas, operárias e rainhas, escaparam do laboratório, indo parar diretamente na natureza. Do cruzamento com outras abelhas do tipo Apis – as europeias, surgiu o que conhecemos, hoje, por abelha Apis mellíferas ou africanizada, sendo conhecida também pelo poderoso ferrão que possui.
por Aline Lira