Da produção ao descarte, qual o tamanho do impacto ambiental do seu jeans?
As várias etapas da produção do jeans apresentam diversos problemas para o meio ambiente; a aposta em uma economia circular pode ser um caminho para diminuir esses impactos
A calça jeans é uma das peças mais versáteis e está presente no guarda-roupa de grande parte das pessoas. Apesar da sua popularidade, o jeans, da confecção ao descarte, muitas vezes inadequado, apresenta diversos impactos para o meio ambiente. Em relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), divulgado em 2020, consta a informação de que a produção de uma calça jeans consome 3.789 litros de água, sem contar o tingimento com produtos químicos poluentes.
Grande parte desse problema surge no Brasil, que é um dos maiores fabricantes de jeans no mundo. A professora Júlia Baruque Ramos, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, pesquisadora na área de reciclagem têxtil, comenta sobre a importância da produção do jeans na economia brasileira. “O Brasil é o quinto maior produtor de têxtil do planeta e o quarto maior produtor de artigos confeccionados. O Brasil tem todas as etapas da cadeia têxtil”.
O jeans no Brasil e os fatores ambientais
Atualmente no Brasil são fabricados, principalmente, dois tipos de jeans. O primeiro é o jeans premium, feito 100% de algodão e com tingimentos, acabamentos e modelagens, mas com o preço mais elevado. O segundo é o jeans misto, geralmente usado no dia a dia, que é composto de algodão com poliéster, e às vezes pode ter poliuretano, conhecido popularmente como lycra, para dar uma maior flexibilidade. Esses dois tipos de jeans são tingidos com corantes sintéticos, que contêm poluentes, ou não são tingidos, que é o jeans branco.
O segundo tipo, o jeans misto, é o mais produzido no Brasil, por ser mais barato e mais resistente, devido à mistura de materiais. No entanto, apesar desses benefícios, a especialista conta que a decomposição desse material tem duas principais problemáticas. “A primeira é a presença do poliéster e poliuretano que dificulta qualquer possibilidade de reciclagem e de transformar o tecido do jeans em fibra de novo e reincorporar. E a segunda é a decomposição, o algodão em mais ou menos três anos se decompõe, mas o poliéster e o poliuretano levam mais de 400 anos.”
Para além dos problemas já citados, Júlia menciona a poluição das águas em razão do tingimento dos tecidos, tanto o misto como o 100% algodão, e das lavagens em casa, que acabam contaminando a água com microplásticos oriundos das fibras sintéticas.
Economia circular
Atualmente, na tentativa de diminuir esses impactos ambientais, o conceito de economia circular está sendo colocado em prática. A ideia é não encerrar o ciclo de vida de determinado produto, neste caso as roupas de jeans, e sim integrá-lo para que seja reciclado e reutilizado para produzir outros itens.
Nos casos das empresas que trabalham com o tecido 100% algodão, elas estão recolhendo as aparas, que são as sobras dos cortes feitos para a produção de uma peça de jeans, e as desfibrando e reincorporando ao algodão virgem para fazer um novo tecido de jeans. Com os tecidos mistos isso não é possível, por sua composição, mas usar suas aparas para preencher almofadas e bichos de pelúcia é uma boa opção para dar continuidade ao seu ciclo de vida.
Pensando no conceito de Economia Circular, a mestranda da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Palloma Reny, em sua tese de mestrado, investigou a logística dos resíduos de jeans 100% algodão, em Toritama, Pernambuco, onde existe um dos maiores polos produtores de jeans do País, e desenvolveu, a partir dela, um composto com possível aplicação para o desenvolvimento de componentes de calçados.
Segundo dados da pesquisa, a indústria de jeans em Toritama gera por mês 800 kg de resíduos. O jeans 100% algodão representa 30% do total. A análise desses resíduos mostrou grande viabilidade para o emprego deles em grande escala e resultou em dois tipos de materiais. “Um com espessura mais grossa e outro mais fino, que demonstraram uma grande aderência para o desenvolvimento de componentes de calçados, como palmilha e contraforte – elemento estrutural do calçado, localizado na parte do calcanhar”, esclarece Palloma.
“Essa pesquisa colabora com a busca pela diminuição dos impactos dos resíduos de jeans. E estimula a remanufatura desses resíduos para um novo ciclo de vida dentro da própria indústria da moda, o que direciona a um percurso para a economia circular”, afirma a pesquisadora.
Vale ressaltar que, por ser um dos maiores produtores têxteis do mundo, o setor emprega milhões de trabalhadores brasileiros. Segundo dados do relatório anual da Associação Brasileira de Indústria Têxtil e Confecção (Abit), em parceria com o Instituto de Estudos e Marketing Industrial (Iemi), o setor têxtil empregava, em 2021, de forma direta, mais de um 1,3 milhão de trabalhadores, e oito milhões se contar os empregos indiretos.