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Bactérias com cristais magnéticos fornecem pistas do ciclo do carbono em ambiente marinho

Bactérias com cristais magnéticos fornecem pistas do ciclo do carbono em ambiente marinho
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Um grupo de microrganismos presentes nos sedimentos marinhos do Saco de Mamanguá, na região de Paraty, litoral sul carioca, chamou a atenção de pesquisadores da USP e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Elas são as bactérias magnetotáticas (MTB), que produzem pequenas estruturas que contém cristais com propriedades magnéticas, os magnetossomos. Estudando essas estruturas, que realizam um tipo de sequestro de carbono no ambiente marinho, os pesquisadores buscam entender não só o ciclo desse elemento químico, ou seja, como ele vai do meio ambiente para os seres vivos e depois retorna ao ambiente, mas também obter evidências da dinâmica do clima e de como é influenciada pela quantidade de carbono. O trabalho é descrito em artigo publicado na edição de outubro da revista científica Environmental Advances.

No ciclo do carbono, o elemento químico sai do meio ambiente, vai para os seres vivos e volta posteriormente ao próprio ambiente, estando presente na atmosfera como um composto gasoso, o dióxido de carbono (CO2). “Esse estudo explica sobre a eficiência dos métodos magnéticos para detectar diferentes quantidades de magnetossomos produzidos pelas bactérias MTB e sua relação com o ciclo de carbono, cujos processos são muitos e complexos, e vários ambientes continentais e oceânicos ainda são pouco estudados”, afirma ao Jornal da USP Luigi Jovane, professor do Instituto Oceanográfico (IO) da USP e um dos autores do artigo. “Consequentemente, grandes incertezas afetam os modelos do ciclo do carbono, o que limita nossa capacidade de compreender e prever a dinâmica climática. Este é o primeiro estudo que permite uma correlação indireta do sequestro por MTB.”

 

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As MTB produzem magnetossomos, que são pequenas estruturas de tamanho nanométrico contendo cristais de magnetita ou greigita envoltos por uma membrana lipoproteica (formada de gorduras e proteínas). “Estes cristais são organizados em uma ou várias cadeias dentro da célula, o que permite que a MTB se alinhe ao longo de um campo magnético”, descreve o professor. “Estudos anteriores sugeriram que a abundância de magnetita biogênica (BS) e biogênica dura (BH) comumente identificadas nessas células varia de acordo com o teor de oxigênio sedimentar.”

“Testamos esta hipótese em um estudo magnético ambiental e geoquímico integrado de alta resolução de sedimentos de superfície do Saco de Mamanguá. Apresentamos as propriedades magnéticas das células MTB Magnetovibrio blakemorei MV-1T e Magnetofaba australis IT-1 e demonstramos que, conforme o teor de oxigênio sedimentar diminui com a profundidade, o componente BS desaparece antes do componente BH, mais resistente à dissolução”, relata Jovane. “Nossas observações confirmam deduções anteriores sobre a relativa estabilidade dessas fases e fornecem uma base mais firme para o uso desses dois tipos de magnetita biogênica como indicadores ambientais.”

Imagens de microscopia eletrônica de transmissão de Magnetovibrio blakemorei MV-1T e Magnetofaba australis IT-1 mostrando a forma das células e as cadeias de magnetossomos – Foto: Cedida pelo pesquisador

Registro fóssil

De acordo com o professor, os magnetossomos têm magnetismo permanente e são estáveis no ambiente, sendo também um registro fóssil das bactérias MTB (magnetofósseis). “As técnicas para o estudo de propriedades magnéticas de rochas fornecem identificação indireta e não destrutiva de magnetofósseis em uma amostra”, observa. “Por meio da metodologia conhecida como magnetismo ambiental, é usado paleomagnetismo e magnetismo de rocha para identificar processos das mudanças ambientais.”

“Estimamos neste trabalho o conteúdo de carbono das MTB e discutimos sua relação com seu ciclo global. Também relatamos dados preliminares sobre sua participação nos processos desse ciclo, bem como a eficácia do uso de metodologia de estudos magnéticos atuais para detectar diferentes concentrações de nanopartículas”, ressalta Jovane. “Um sistema sedimentar com MTB atua de certa forma como um sequestrador desse elemento químico. Estas observações são necessárias para quantificar os fluxos relacionados a uma complexa rede de processos e estabelecer o balanço do sistema ambiental ligado ao reservatório sequestrado pelas MTB. Este estudo representa um trabalho pioneiro nos processos do ciclo que ainda não foram identificados e que precisam ser estudados para sistemas sedimentares antigos.”

Resposta das propriedades magnéticas em relação a concentração de células de MTB mostrando aumento significativo nas propriedades das concentrações altas – Foto: Cedida pelo pesquisador

Segundo o professor, para avaliar com confiança o impacto do ciclo do carbono nos ecossistemas naturais, é fundamental entender a complexidade do seu fluxo e as restrições do seu balanço líquido. “Existem basicamente três tipos diferentes de sistemas industriais de captura de CO2”, relata. “Há a pós-combustão, onde ele é absorvido por um solvente químico ou filtrado por membrana de alta pressão; pré-combustão, que usa um processo chamado gaseificação; e oxi-combustão ou combustão de oxigênio.”

Também podem ser empregados sistemas de captura e sequestro do CO2 presente no meio ambiente, conhecidos como Remoção de Dióxido de Carbono (CDR). “Entre eles estão o reflorestamento para criar sumidouros de carbono, captura atmosférica (Direct Air Capture, DAC), sequestro nos solos e conversão em etileno puro, obtendo oxigênio e combustíveis à base de carbono como subprodutos da reação”, aponta Jovane. “Aqui estamos propondo um novo fator, que age no sequestro desse elemento por meio da produção das bactérias MTB no sedimento marinho.”

A pesquisa, descrita no artigo Carbon sequestration assessment using varying concentrations of magnetotactic bacteria foi desenvolvido em colaboração pelo IO e o Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O estudo tem apoio de um projeto temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Mais informações: e-mail jovane@usp.br, com o professor Luigi Jovane

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Trajano Xavier

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