Nativa da Mata Atlântica, espécie resiste em locais inóspitos, quase inacessíveis
Acima das nuvens, reina a imperatriz do Brasil. Tem como trono as montanhas, e por cor, o lilás. A imperatriz é uma das flores mais belas e ameaçadas de extinção do mundo. Nativa da Mata Atlântica, ela só existe no estado do Rio de Janeiro. Apreciá-la em seu habitat é um privilégio, já que restam apenas 12,4% do bioma e a imperatriz sobrevive em lugares inóspitos, quase inacessíveis. É justamente documentar raridades da flora da Mata Atlântica, como a imperatriz, a paixão do fotógrafo da natureza e biólogo Felipe Tubarão.
“Busco as plantas mais raras. Temos bromélias e orquídeas simplesmente fabulosas. Inclusive micro-orquídeas, que medem milímetros e são polinizadas por formigas”, diz Tubarão, que também é guarda-parque do Instituto Estadual do Ambiente (Inea).
Tubarão afirma que fotografar as raridades da Mata Atlântica exige paciência e persistência. Para esperar que uma flor desabroche, ele volta a um mesmo local muitas vezes, seja uma floresta densa e sem trilhas ou um topo de montanha de encostas íngremes. As visitas podem se repetir por meses até chegar ao resultado esperado. E Tubarão tem pressa, sabe que a Mata Atlântica agoniza.
A Floresta Atlântica está sob intenso ataque. O desmatamento cresceu 66% de 2020 para 2021 em relação ao período 2019-2020, segundo o Atlas da Mata Atlântica apresentado esta semana. O aumento chega a 90% em relação ao período de 2017-2018.
Nos domínios da Mata Atlântica, vivem 72% dos brasileiros e é gerado 70% do PIB do País. O bioma presta serviços ambientais como produção de água e regulação do clima para toda essa gente. E esses serviços são resultado de uma complexa rede de interações entre vegetais e animais, da qual plantas raras e belas como as que Tubarão registra são exemplos.
Fotografar a imperatriz do Brasil (Worsleya procera) ou rabo-de-galo significa escalar montanhas, enfrentar sol a pino e frio intenso. Restam poucas delas isoladas nos campos de altitude que se estendem nos topos de montanhas de Petrópolis, a cidade imperial da qual a flor é símbolo.
Fóssil vivo
Com caule que chega a 1,5 metro e flores do tamanho de copos, a imperatriz é luxo e glória. E também mistério. É considerada um fóssil vivo, último representante de uma família de plantas pré-históricas. O fato de ser antiga não a torna bem conhecida. Nunca se descobriu qual o seu polinizador e nem o porquê de suas flores estarem sempre voltadas para o norte. É extremamente difícil cultivar a planta, por isso, colecionadores a levaram à beira da extinção.
Tubarão jamais revela o local exato onde estão as plantas justamente para tentar evitar a coleta. Quase todas estão nas montanhas porque os terrenos íngremes do Rio salvaram a Mata Atlântica da total devastação.
O estado tem 884 espécies de plantas endêmicas, isto é, que só existem aqui. Destas, 513 (58%) estão ameaçadas de extinção. Tubarão já registrou o florescimento de cerca de 10% delas.
Algumas espécies florescem apenas por poucos dias. Já outras levam mais de uma década para desenvolver os primeiros pendões florais, como a orquídea Laelia crispa, nativa da Floresta da Tijuca, em extinção e apreciada pelas flores brancas e exuberantes.
“As orquídeas maiores, como a Laelia, são cada vez mais difíceis de se ver na natureza porque foram intensamente coletadas, e também devido à perda de seu habitat. Por isso, as unidades de conservação são fundamentais. Muitas espécies só resistem graças a elas”, destaca Tubarão.
Devido ao isolamento e à altitude, os campos no alto das serras preservaram espécies que já desapareceram de outros lugares, e que ali vivem no limite. Estudos já indicaram que a elevação da temperatura de um grau a dois graus seria suficiente para acabar com muitas espécies. O aumento do período de estiagem, por exemplo, pode acabar de vez com a imperatriz.
Nesta época, nos campos, está em flor uma planta vista por pouca gente. Trata-se da Prepusa connata, que de tão rara nem nome popular tem. Essa flor exclusiva da Serra dos Órgãos foi descrita pelo botânico inglês George Gardner em 1842 e corre o risco de se tornar apenas um registro do passado, pois foi definida como criticamente em perigo de extinção, a última classificação antes da categoria de completamente extinta na natureza.
As montanhas guardam os maiores tesouros, mas as áreas pantanosas remanescentes também reservam surpresas, como a orquídea Cattleya forbesii, restrita aos mangues, brejos e pântanos do Sul e Sudeste do País. Porém, o fotógrafo não esconde sua predileção pelos campos de altitude fluminenses, habitats extremos, em risco de desaparecer devido às mudanças climáticas.
Devido ao isolamento e à altitude, esses campos no alto das serras preservaram espécies que já desapareceram de outros lugares. Mas ali as plantas vivem no limite. Estudos já indicaram que a elevação de temperatura de 1 grau a 2 graus seria suficiente para acabar com muitas espécies. O aumento do período de estiagem, por exemplo, pode acabar de vez com a imperatriz.
Nesta época, nos campos, está em flor uma planta vista por pouca gente. Trata-se da Prepusa connata, que de tão rara nem nome popular tem. Essa flor exclusiva da Serra dos Órgãos foi descrita pelo botânico inglês George Gardner em 1842 e corre o risco de se tornar apenas um registro do passado, pois foi classificada como criticamente em perigo de extinção, a última categoria antes da categoria de completamente extinta na natureza. “Os botânicos que visitarem o país no futuro, em vão procurarão plantas colhidas por seus predecessores”, escreveu Gardner.
Tubarão espera que fotos como as suas, que revelam a beleza da biodiversidade, sejam mais do que registros e também ajudem a aumentar a consciência e o cuidado ambientais.
“A sociedade precisa conhecer seu patrimônio, cobrar e colaborar para que seja preservado. Antes que seja tarde demais e tudo o que reste sejam fotografias”, salienta Felipe Tubarão.
Fonte: Um Só Planeta