A ‘capital dos ursos polares’ que está esquentando rápido demais, o que pode levar animais à morte
“Os ursos sabem que o gelo vai voltar em breve. Eles estão esperando”, diz Alysa McCall, da entidade de conservação Polar Bears International (PBI).
Alysa e sua equipe estão no Ártico canadense nos arredores da pequena cidade de Churchill, em um laboratório móvel de observação nas trilhas, que lhes permite observar os ursos em segurança.
Churchill é apelidada de a “capital do urso polar” do mundo.
A vida cotidiana é moldada pela proximidade dos ursos polares com a cidade. Os residentes têm latas de lixo à prova de ursos e a província emprega guardas de patrulha de ursos para acompanhar as crianças quando estão pedindo “doces ou travessuras” no feriado de Halloween.
É comum na cidade deixar as portas dos carros estacionados destrancadas para que outras pessoas tenham para onde correr caso encontrem um urso errante.
Na congelada Baía de Hudson, em Churchill, os ursos usam o gelo marinho como plataforma para caçar focas.
Mas a temporada sem gelo marinho nesta parte do Ártico canadense está se alongando, deixando os ursos sem ter como caçar por longos períodos.
Cerca de 2mil km ao sul, em Montreal, autoridades internacionais estão reunidas na cúpula da biodiversidade da ONU em um esforço para chegar a um acordo que proteja os espaços selvagens e reverta a perda da natureza causada pelo homem.
Até 2050, dizem os cientistas que estudam conservação, a duração da estação durante a qual não há gelo pode levar os ursos ao ponto de morrer de fome.
“Olhando para as últimas duas décadas, o gelo se forma cada vez mais tarde e se decompõe cada vez mais cedo na primavera”, diz o pesquisador Flavio Lehner, da PBI.
“Portanto, esta temporada intermediária – onde os ursos estão em terra e não podem aproveitar as oportunidades de caça – está ficando cada vez mais longa com o aquecimento global.”
Os ursos dependem da gordura das focas para obter energia. As mães que criam seus filhotes, em particular, precisam consumir gordura suficiente.
“Aos 180 dias [sem gelo marinho], começamos a ver impactos em seu sucesso reprodutivo”, diz Lehner. “Então, com um tempo maior, provavelmente veremos declínios, simplesmente porque eles não podem mais se reproduzir com sucesso.”
Esses predadores onívoros comem quase tudo que encontram em terra, incluindo frutas, ovos, pequenos roedores e até renas, diz McCall, “mas nada substitui a gordura de foca [com alto teor de energia]”.
Essas mudanças também estão aproximando ursos e humanos, tornando lugares como Churchill, onde os ursos polares e as pessoas coexistem, mais arriscados para ambos.
Um estudo do US Geological Survey, usando dados de colares de rastreamento por satélite em mais de 400 ursos polares no Alasca, mostra que o tempo que eles passam em terra aumentou significativamente nas últimas décadas.
“Na década de 1980, os ursos polares passavam apenas algumas semanas em terra a cada verão”, diz Karyn Rode, bióloga pesquisadora da vida selvagem do USGS. “Agora, muitos passam quase dois meses em terra a cada ano.”
E as comunidades ao longo de North Slope, no Alasca, já viram ursos anteriormente.
O destino de Churchill, de seu gelo marinho sazonal e das centenas de ursos polares da Baía de Hudson depende fundamentalmente do que cada país do mundo fizer para reduzir as emissões dos gases que aquecem o planeta e que estão mudando a atmosfera da Terra tão rapidamente.
“As projeções de gelo marinho são fortemente dependentes da temperatura – e a temperatura é ditada por quanto gás de efeito estufa emitimos na atmosfera”, diz Lehner.
McCall diz que a subpopulação de ursos do oeste da Baía de Hudson, que ela e seus colegas estudam, diminuiu até 30% nos últimos 30 a 40 anos, devido ao menor acesso ao gelo marinho.
“É um alerta sobre o que está por vir para os ursos polares que vivem mais ao norte [onde os invernos gelados são atualmente mais longos]”, acrescenta ela.
Lehner diz que a mudança climática transformou a forma como devemos pensar em conservação.
“Ele permeia toda a vida neste planeta”, disse diz ele à BBC. “Então criar reservas, como um parque nacional, não é ruim, mas não vai ajudar se esse ecossistema mudar por causa das mudanças climáticas.”
“Estas não são questões separadas – se você se importa com os animais, se você se preocupa com a conservação, você tem que se preocupar com as mudanças climáticas”.
Fonte: BBCnews