A fantástica história dos caçadores de dinossauros no Nordeste
Ao contrário de muitas crianças, Leonardo Marinho nunca teve uma particular curiosidade ou fixação por dinossauros. O interesse por esses animais veio quase por acaso, enquanto fazia sua pesquisa de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Geociências da Universidade Federal de Pernambuco. Em 2021, com o isolamento social ainda em vigor, estava em casa, estudando alguns fósseis, quando ao ler um artigo enviado em um grupo de WhatsApp percebeu que uma vértebra coletada em 2019, em Ibimirim, no sertão pernambucano, e até então tida como pertencente a um crocodilo, poderia ser de um dinossauro.
Empolgado, acionou os professores Edison Oliveira (biólogo) e Gelson Fambrini (geólogo), respectivamente seu orientador e coorientador, e os três se lançaram em uma investigação profunda, de muitas leituras, comparações de dados científicos e revisão. Acionaram pesquisadores nos Estados Unidos e na Alemanha e se depararam não só com a confirmação de suas suspeitas – mas também com a informação de que se tratava do registro mais antigo de um dinossauro no Nordeste. O animal viveu durante o Jurássico Médio, ou seja, entre 174 milhões e 163 milhões de anos atrás.
“No cinema, normalmente os pesquisadores já acham o fóssil com a estrutura completa do dinossauro, conseguem ver a espécie, têm tudo bem claro, mas na realidade quase nunca é assim. No nosso caso, estávamos coletando diversos fósseis nos últimos anos, em trabalhos de campo com alunos da graduação e pós-graduação, e em 2019 encontramos essa vértebra, com outros achados. Quando vamos para campo, fazemos muitas coletas e na hora não identificamos exatamente o que é o material; fazemos uma pequena descrição e levamos para ser estudado na universidade. A partir desses fragmentos que achamos, a análise pode levar dois, três anos ou mais, dependendo dos recursos”, explica Marinho.
Sonho
O dinossauro é o terceiro encontrado em Pernambuco – e o único que permanece no Estado (um está no Museu de Ciências da Terra, no Rio, e o outro foi levado ilegalmente para a Alemanha). Pela vértebra, surgiu a comparação com o Dilophosaurus, um terópode (subgrupo de dinossauros bípedes do qual também faz parte o Tiranossauro Rex) de cerca de dois metros, também encontrado na América do Norte e em parte da África, como na África do Sul e na Tanzânia. “Eu não tinha familiaridade com dinossauros. Até brinco com meus amigos que pulei a fase que algumas crianças têm de fascínio por eles, de decorar todas as espécies. Depois da descoberta, comecei a ler mais, me aprofundar, e estou apaixonado. No meu doutorado, inclusive, estou procurando balancear o estudo da geologia com o dos dinossauros”, conta o geólogo e paleontólogo. “Esse achado também me deixou muito feliz porque sei como Gelson e Edison desejavam encontrar dinossauros na região. É muito bom poder concretizar esse sonho com eles.”
Para Gelson Fambrini, o achado foi, de fato, uma realização pessoal, resultado de um trabalho de cerca de 15 anos. Nascido em São Paulo, ele mudou-se para Pernambuco para lecionar e estudar a Bacia de Jatobá, que está localizada, entre outras, em cidades como Ibimirim, Petrolândia, Buíque, Arcoverde e Sertânia. Como algumas rochas da área estudadas por eles já eram datadas do período Jurássico, especialmente da Formação Aliança, ele tinha grandes expectativas de que existissem fósseis de dinossauros – porém, até então, não havia encontrado.
“Há pesquisadores que passam a vida toda e não achavam um fóssil de dinossauro. É uma junção de dedicação e sorte, ainda mais em uma região como a que nós encontramos, que no passado era um lago e, ao longo dos anos, passou por longos períodos sem chuva. Essas condições climáticas fazem com que os fósseis fiquem muito fragmentados. Por isso nosso trabalho é tão minucioso”, explica Gelson. “Brincamos que somos como a Sociedade do Anel, do Senhor do Anéis, em nossas empreitadas no meio da caatinga. É um trabalho em equipe e com suas adversidades, tanto de ordem física, como estar cavando por horas sob o sol, quanto financeira. Por vezes tive de tirar dinheiro do bolso para bancar pesquisas de campo.”