Indonésia destrói habitat de dragões-de-komodo para construir resort
(Foto: Sergey Uryadnikov/Shutterstock)
Jurassic Park, filme de Steven Spielberg baseado no livro homônimo de Michael Crichton, é uma espécie de fábula moral sobre os perigos da manipulação da tecnologia pelos humanos, o fracasso da humanidade por meio disso, a influência da tecnologia na condição humana e os avanços científicos que dão errado.
O trabalho de Crichton, pioneiro no gênero moderno denominado techno-thriller, foi sempre salientar e discutir a perigosa aceitação do poder tecnológico pela humanidade sem considerar a segurança ou repercussões éticas. Isso é observado em todas as obras do autor, de The Andromeda Strain (1969) a sua série ER – Plantão Médico (1994), em que Crichton afirma que o homem não deve perder de vista sua humanidade ao lidar com a aplicação da ciência e da tecnologia, explorando os perigos de confiar nessa mesma tecnologia.
Além disso, apesar de a maioria do público que assiste Jurassic Park saírem do cinema apenas chocados com a magnitude do CGI e da produção, o filme também dá longas pinceladas sobre os perigos que a ambição humana pode oferecer, como a cegueira, acompanhada pelo egoísmo e a ganância, responsáveis por guiarem os avanços científicos.
Muito embora a história tenha um contexto distópico, alguns aspectos dela, como os mencionados acima, estão mais presentes do que nunca, e os últimos pseudodinossauros vivos da Terra, os dragões-de-komodo, são testemunhas disso.
Destruição sistemática
A Ilha Rinca, no Parque Nacional de Komodo, parte do arquipélago da Indonésia, é um refúgio de 1126 quilômetros quadrados de pura fauna e flora, tornado Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) desde 1980 e transformado pelo governo indonésio em um ponto turístico premium.
O local deveria ser onde os dragões-de-komodo pudessem viver para sempre sem serem incomodados pela influência humana, visto que é o único lugar na Terra que sobrou para eles, que chegaram ao arquipélago há cerca de quatro milhões de anos, vindos da Austrália.
Ao longo dos anos, os dragões se espalharam por Flores, Bornea e outras ilhas, quando os níveis de água eram mais baixos, o que permitiu conservar a sua raça — visto que, com a chegada dos primeiros aborígenes ao território australiano (através do mar do sudeste asiático entre 40 e 70 mil anos atrás), os animais começaram a ser extintos.
Por muito tempo, o Parque Nacional de Komodo permaneceu livre de humanos, até que o governo indonésio o fechou aos visitantes — que nem sequer deveriam pisar no habitat dos animais — após denúncias de que uma quadrilha estava contrabandeando os lagartos da ilha. Segundo a BBC, dos 45 animais roubados, 41 foram vendidos até o momento que a matéria foi escrita.
Esse escândalo serviu apenas de pretexto para alimentar a ideia capitalista e ambiciosa das autoridades indonésias, que deram início ao processo de terraplanagem do Parque Nacional de Komodo para a construção de um megarresort turístico, com o intuito de fazer dele uma nova Bali.
A natureza contra o homem
Contas pela rede social Twitter, como a do usuário @KawanBaikKomodo, fizeram o possível para divulgar a profanação do ambiente natural pelo projeto de construção. Uma foto compartilhada pelo grupo ativista Save Komodo Now surgiu no Instagram no ano passado, causando a fúria dos ambientalistas ao capturar trabalhadores sentados no topo de um caminhão observando um dragão-de-komodo andando pela terra revirada na zona de obra.
Como aponta a IFL Science, funcionários da Unesco entraram em contato com o governo indonésio para afirmar que o projeto, cujos detalhes não foram divulgados, levanta a questão de como esse modelo de turismo se encaixa na visão do Estado de se afastar do turismo de massa para abordagens mais sustentáveis.
Em resposta, o Diretor-Geral de Conservação da Natureza e Ecossistemas do Ministério do Meio Ambiente da Indonésia disse, de maneira cínica, que o projeto prosseguiria, e que provava que não oferecia nenhum impacto ao habitat dos dragões.
Contudo, a foto simbólica do dragão e o caminhão dividindo espaço diz o contrário. Foi por isso que a imprensa mundial apelidou o projeto indonésio de “Jurassic Park da vida real”, que continua sendo desenvolvido sem informações.
“Esse tipo de desenvolvimento massivo perturba a interação dos animais. Isso mudará totalmente seu habitat”, disse Greg Afioma, membro da Save Komodo Now. Atualmente, cerca de dois mil habitantes indígenas vivem nas ilhas de Komodo, Rinca, Padar, Nusa Kode e Gili Motag ao lado dos animais.
Como questiona a matéria da BBC: qual será o impacto desse projeto no futuro? Alguém ainda se preocupa com a preservação?
Fonte: Mega Curioso