Investimento na preservação do meio ambiente estimula economia da cidade histórica de Sabará (MG)
Situada na estrada real, a 21 km de Belo Horizonte, está a charmosa cidade histórica de Sabará (MG), rodeada por montanhas. Com ruas estreitas e íngremes, o primeiro povoado colonial de Minas emana cultura, gastronomia, natureza, além daquela sensação impagável de paz e calmaria de cidade pequena. A população local é de cerca de 129 mil habitantes.
No Centro Histórico da cidade é possível caminhar pelas vias de paralelepípedos e contemplar igrejas do século XVIII. A sensação é de estar voltando no tempo ao passar pelos chafarizes, casarões, com arquitetura colonial. A cidade, que foi rota de extração do ouro, também é conhecida por ser a terra da jabuticaba, além do ora-pro-nóbis (hortaliça rica em proteínas) e da banana.
A jabuticaba, chamada pela população sabarense de ouro negro, é patrimônio imaterial da cidade. Para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico local e a conservação do meio ambiente, o Probiomas realiza um projeto de educação ambiental, treinamento para agricultores, plantio de mudas nas nascentes, entre outras ações.
O Fundo Social da CAIXA investe R$ 6,4 milhões na ação que visa reduzir o desmatamento da mata atlântica e do cerrado, preservar nascentes e colaborar com a inclusão social. A região conta com 2,6 mil hectares desmatados e, hoje, o projeto cuida de 480 hectares.
Fernando Madeira, coordenador do Probiomas, explica como esse apoio é investido no projeto. “O projeto está oportunizando, de forma gratuita, com orientação técnica, com a visão diferenciada para que as pessoas vejam essa região do quadrilátero ferrífero não só como uma região que extrai recursos naturais, como a mineração e outras práticas nada ecológicas, mas como uma região que tem a mineração como ativo e também tem ações ambientais importantes e que conseguem conviver pacificamente com a retirada de produtos naturais do ambiente e a sua reposição através de plantios, de implantação de Sistemas Agroflorestais que permitam manter as pessoas também no campo”, afirma.
Na Probiomas, há um viveiro destinado à produção, manejo e proteção das mudas até que elas tenham idade e tamanho suficientes para serem plantadas em local definitivo.
“A gente sempre sugere o plantio de jabuticabeira na área de reserva legal e ela é fundamental para manter a circulação hídrica e para produção do fruto, que mantém uma cadeia produtiva que já tem algumas dezenas de anos em Sabará”, explica Fernando.
Na Probiomas há também um laboratório para produção de derivados. É ali que Edi Pinto solta a imaginação, criando salgados de jabuticaba, banana e ora-pro-nóbis. Possui muitos clientes vegetarianos, veganos e intolerantes e, com a ajuda do programa, criou uma linha especial para esse público. “Eu encontrei o que eu precisava dentro do Probiomas, com o apoio que tem, com os incentivos e com a técnica e qualidade da estrutura da cozinha”, relata.
Rodson Rocha também recebe assistência técnica do projeto para desenvolver sucos, chás, saborizante para café e javine. Também compra queijo e matura com jabuticaba. “Estou descobrindo muita coisa. Está sendo muito bom esse projeto. Pretendo me desenvolver e ter uma produção maior. O conhecimento aqui é muito legal. Quero montar uma fábrica e empregar muitas pessoas um dia”, explicou.
Herança Cultural
A dimensão histórica e patrimonial de Sabará é facilmente retratada pelo turismo local. Além da culinária, que engrandece os produtos regionais, a arquitetura colonial e o artesanato impulsionam a visitação turística.
Em 2023, Sabará promoveu oito festivais, entre gastronomia, cultura, música e artesanato. Além dos eventos sazonais, a cidade apresenta aos turistas feiras livres, onde artesãos exibem derivados da jabuticaba, cosméticos orgânicos, arte sacra, palma barroca, renda turca de bicos e outros adornos típicos do artesanato sabarense.
Lucinda Rosa conta que a OR Natural, marca de cosméticos com produção sustentável, nasceu da conexão de uma necessidade com o amor pelas ervas.
“Minhas meninas cresceram com minha vó e minha mãe junto, tiveram essa convivência. E aprenderam essa coisa do remédio, do chá, do shampoo com as ervas e frutas. Mas elas foram morar fora, estudar faculdade, uma engenharia e a outra marketing, e seguiram a vida. Foi quando minha filha mais velha, teve problema do cabelo começar a cair e o dermatologista falou pra ela usar shampoo natural em barra. Aí que ela tomou consciência que já tinha aprendido com a avó como fazer o shampoo”, explica Lucinda.
“Então, ela resolveu voltar para o campo e desenvolver a linha dos cosméticos orgânicos. Em seguida a mais nova também veio para ajudar. E é meu orgulho dizer que a mais velha já vai formar em engenharia química e ela mesma vai assinar as fórmulas dos nossos produtos”, complementa.
Esse resgate citado pela Lucinda desperta o interesse pela própria cultura, torna as pessoas mais conscientes da importância de suas origens, do retorno às essências. Além de cultivar plantas medicinais aromáticas para produzir cosméticos, Lucinda possui ameixa, abacate, manga, goiaba, limão, jabuticaba, banana e cítricos na sua propriedade, com a implantação do Sistema Agroflorestal.
Turismo e comércio
A carioca Sirley Senatore, 76 anos, já esteve em Sabará algumas vezes. Voltou ao município com as amigas em uma excursão. “Gosto da culinária: já provei várias coisas. Estou levando um licor de jabuticaba daqui porque é uma delícia. Acho o sabor bom, exótico”, conta a idosa, enquanto degustava a bebida
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Esse licor que fez sucesso com a Dona Sirley foi produzido pela Olga Caixeta, que também desenvolve geleia, barbecue, mostarda, cobertura para sorvetes, vinho e pimenta. Tudo de jabuticaba. Ela cultiva a fruta no quintal e conta que se incomodou com o desperdício. “Colhi, tentei vender, mas não consegui o tanto que precisava. Aí me lembrei das receitas de família e, no ano seguinte, comecei a fazer os produtos para o Festival de Jabuticaba da cidade”, conta a senhora.
Olga é dona da marca “Ó Pretinha” e recebeu consultorias da Probiomas sobre rotulagem, limpeza, plantio e aprimoramento dos produtos derivados da jabuticaba. “Não é fácil chegar com os produtos nas prateleiras, não”, diz. O sonho dela é não deixar o trabalho “morrer”; quer repassar para algum familiar o legado. Como boa mineira, ofereceu um delicioso lanche para a equipe do CAIXA Notícias, além, claro, de uma boa prosa.
Perto dali, encontramos dona Dirléia Conceição Peixoto, proprietária da marca Flor de Jabuticaba, de produção artesanal, que envia os produtos para outras cidades. A mineira conta que deve ao Probiomas seu crescimento profissional. Esforçados, ela e o esposo, fizeram todos os cursos ofertados pelo projeto.
“A gente cresceu vendo jabuticaba e minha mãe foi criando os produtos. Ela nos ensinou e começamos a fazer para vender. Casei e, com meu marido, fizemos para comercializar. Passado uns anos veio um curso de Probiomas e nos inscrevemos. Ajudou a gente a crescer, a se profissionalizar. Aprendemos sobre esterilizar; nosso rótulo era caseiro e aprendemos a fazer um bacana. O cliente vinha, via o rótulo bonito e de acordo com a legislação. Melhoramos os nossos produtos em vários aspectos”, relata.
“A gente achava que podia usar vinho de jabuticaba. Mas aprendemos que teria que criar um nome e, abaixo, colocar fermentado da jabuticaba. O projeto deu várias dicas. Colocamos no nosso rótulo ‘jabuvinho’. Eu tenho carinho pela CAIXA. Sempre cito que consegui esse curso pelo Probiomas por causa da Caixa”, conta Dirleia, dona de uma receita de bolo de jabuticaba, com casquinha crocante, capaz de acabar com qualquer dieta.
Aluguel de pés de jabuticaba
Rosângela Augusta Lourenço, produtora rural, tem mais de 50 pés de jabuticaba no terreno. Atualmente, aumenta a renda alugando os pés. “O cliente passa o dia e pode pegar a quantidade de fruta que desejar. Aqui tinha muito pé de jabuticaba e perdia muito. Aí começamos a alugar”, conta a professora.
Ela é do tempo em que havia água com abundância na região. “A água é importantíssima. No tempo da chuva está tranquilo, mas na seca castiga muito. A gente precisa da água; sem ela não tem vida. Minhas nascentes já secaram e a gente traz 3 km canalizada”, relata. “A gente colhe o que planta. Se você quer que a natureza te retorne, você tem que conservar. Temos que economizar o máximo dela. A água é tudo”, complementa.
O CAIXA Notícias se despede dessa viagem, ou melhor, dessa reportagem em Sabará com um poema do compositor e ribeirinho, Silas Fonseca. Aos 72 anos, possui trabalhos autorais sobre a água, pois passou a infância às margens do rio e desenvolveu uma paixão pelo tema. “É uma tentativa para devolver para o rio o que ele me deu”. Hoje, o rancho dele é também um espaço ecológico onde alunos das redes municipais de ensino são recebidos para discutir temas sobre meio ambiente, claro, com muita poesia.
“Este rio que aqui passa,
Preguiçoso, sem graça
Não foi sempre assim
Quando eu era guri e ia pescar lambari,
Se eu não pescava nada, ele dava risada”.
De onde vem o nome Sabará?
O nome Sabará tem várias interpretações. Uma das mais prováveis é a corruptela do tupi-guarani sabaá (enseada, curva do rio) e buçu (grande), designando o encontro do rio Sabará com o rio das Velhas. Outra interpretação é que o nome Sabarabuçu é uma derivação de Itaberabuçu, isto é, montanha grande que resplandece, numa alusão à atual Serra da Piedade.