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O projeto inovador que salvou corais da destruição após furacão

O projeto inovador que salvou corais da destruição após furacão
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Com o banco de corais partido ao meio e os corais transformados em escombros, o mundo subaquático do Parque Nacional Laughing Bird Caye, na costa de Belize, não se parecia em nada com o lugar vibrante e colorido que prosperava com vida antes de ser varrido pelo furacão Iris, em 2001.

Quando Lisa Carne visitou a ilha pela primeira vez, em 1994, havia tantos corais elkhorn laranja-avermelhados enormes entrelaçados, que ela mal conseguia nadar entre eles ou ao seu redor.

O recife era abundante em peixes, corais, lagostas, caranguejos, esponjas e tartarugas marinhas. Mas, depois do furacão, tudo isso foi destruído.

 

Não era a primeira vez que Carne via um recife morto. Em 1995, ela se mudou da Califórnia para Belize, e trabalhou como assistente de pesquisa voluntária na Carrie Bow Cay, uma estação de campo da Smithsonian Institution.

Ela testemunhou os efeitos do primeiro fenômeno de branqueamento de coral em Belize, que abriga a segunda maior barreira de corais do mundo.

O branqueamento deixa a estrutura dos corais intacta, mas o coral perde as algas que vivem em uma relação endossimbiótica com seus pólipos.

Carne quis começar a repovoar imediatamente os recifes com o plantio de corais, mas demorou muitos anos para convencer os financiadores de que sua ideia era viável.

As pessoas argumentavam, e ainda argumentam, que sem resolver os problemas que causam a morte dos corais, colocá-los de volta no recife não faria sentido.

Durante cinco anos após o furacão Iris, o recife ficou descoberto. Havia poucos corais vivos, cardumes de peixes ou lagostas, e o fundo do mar estava coberto de destroços de recife e esponjas incrustadas.

Carne começou a apresentar suas propostas de restauração em 2002, mas por vários anos não teve sorte.

Até que, em 2006, os Estados Unidos colocaram os corais acroporídeos caribenhos (o tipo de coral ramificado de crescimento mais rápido no Caribe e principal formador de recifes) na lista de ameaçados de extinção, e um financiador local aprovou o projeto de Carne para restaurar o recife.

Carne começou fazendo um teste, transplantando 19 fragmentos de coral elkhorn da principal barreira de recife a cerca de 31 km de distância.

“Elas pensavam que esses corais eram comuns, como areia. Mas, depois de duas semanas de mapeamento, descobri que eles não estavam mais em todos os lugares.”

Na verdade, ela descobriu que a estrutura e cobertura dos corais — que abrangiam de 15% a 28% da área do parque nacional antes da tempestade — haviam caído para menos de 6%.

Como a sobrevivência inicial dos transplantes realizados em 2006 foi alta (mais de 80% ainda estão vivos hoje), ela continuou a identificar os corais sobreviventes e começou a semear novamente os recifes em 2010.

Mas restaurar um recife não é tão simples quanto pode parecer e envolve tentativa e erro, geralmente com aprendizados ao longo do caminho.

Quando os cientistas começaram a explorar a ideia de restauração de recifes, eles pensavam que quanto maior o transplante, maior a chance de sobrevivência.

Mas, em 2015, o biólogo marinho David Vaughan descobriu que o oposto também pode ser verdadeiro — quanto menor o fragmento, mais rápido ele cresce.

Enquanto inicialmente a equipe de Carne cortava os corais em pedaços de cerca de 10 cm e os cultivava em um viveiro até atingirem cerca de 30 cm para depois transplantá-los para o recife, esta descoberta permitiu que a equipe acelerasse as taxas de crescimento no viveiro para certas espécies de coral e pulasse completamente esta etapa para outras.

Carne trabalhou com outros pesquisadores em genética de corais, doenças, branqueamento e reprodução para buscar a melhor maneira de restaurar o recife.

Em 2009, Illiana Baums, professora de Ecologia Molecular da Universidade Estadual da Pensilvânia, nos Estados Unidos, a aconselhou sobre a distância adequada para plantar diferentes exemplares de cada espécie de coral para estimular a desova (reprodução sexuada — que aumenta a diversidade genética e a resiliência dos recifes).

Apesar desses avanços, a tarefa de replantar corais em mais de um hectare de recife raso era demais para uma equipe de pesquisa de duas a quatro pessoas.

Depois que o mapeamento de Carne revelou a extensão dos danos aos corais, a população local percebeu como eles haviam se tornado escassos.

Pescadores e guias turísticos da aldeia vizinha de Placencia foram os primeiros a notar o sucesso dos esforços de transplante de corais, e se ofereceram para ajudar Carne com o plantio.

Em 2013, Carne registrou uma organização comunitária sem fins lucrativos em Belize chamada Fragments of Hope, e dois anos depois abriu uma filial nos Estados Unidos.

A Fragments of Hope desenvolveu um curso de treinamento em restauração de corais, aprovado pelo Departamento de Pesca de Belize, que certificou mais de 70 belizenhos até agora, diz Maya Trotz, professora de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade do Sul da Flórida, nos Estados Unidos, e membro do conselho americano da Fragments of Hope.

“A Fragments of Hope engaja os jovens e criou livros para colorir e quebra-cabeças sobre o recife, apresentando a arte de um artista local”, diz Trotz.

O monitoramento de longo prazo mostra que 89% sobreviveram após 14 anos — muito mais do que a sobrevivência típica após uma restauração.

Os relatórios também sugerem uma tendência ascendente nos corais ao redor de Belize como um todo, passando de 11% do fundo do mar pesquisado em 2006 para 17% em 2018 por meio da recuperação natural.

Com uma população relativamente pequena de aproximadamente 420 mil habitantes, Belize não exerce tanta pressão sobre seus recifes como seus vizinhos mais populosos.

“Acho que os fatores fundamentais para o sucesso da Fragments of Hope são a abordagem baseada na ciência, o vasto conhecimento local e a dedicação e persistência de Lisa”, afirma Baums.

Belize proibiu a pesca de arrasto de camarão, o uso de redes de emalhe, a exploração de petróleo em alto mar e protegeu totalmente as famílias de peixes que se alimentam das algas dos recifes, como o peixe-papagaio e o peixe-cirurgião.

Como a única organização que pratica a restauração de recifes em Belize, a Fragments of Hope tem sido capaz de cooperar com o governo.

Mas, apesar das restrições do governo, houve um desenvolvimento costeiro descontrolado, que destruiu bancos de corais de manguezais em Belize.

“É difícil acordar todas as manhãs e fazer o que você faz quando há decisões maiores sendo tomadas que você não pode controlar”, diz Carne.

As técnicas desenvolvidas pela Fragments of Hope foram aplicadas com sucesso na Colômbia, Jamaica e na ilha caribenha de Saint Barts, assim como em sete áreas marinhas protegidas e dez outros lugares em Belize.

Antes da Covid-19, a Fragments of Hope organizou intercâmbios, visitas de estudo e workshops para compartilhar experiências em todo o Caribe.

As pessoas aprenderam como selecionar um local de restauração apropriado com base em uma longa lista de critérios, montar viveiros, aparar corais e usar cimento para o plantio.

“A Fragments of Hope é um centro de inovação, atraindo talentos da Península de Placencia e de todo o mundo, todos inspirados na abordagem proativa de restauração de corais”, diz Trotz.

Após 15 anos de esforços de restauração, o recife de coral do Parque Nacional Laughing Bird Caye, que já foi um cemitério de destroços, agora está cheio de vida.

Cardumes de peixe-papagaio e peixe-cirurgião também voltaram e se alimentam das algas dos recifes para que os corais possam se propagar ainda mais.

“Não vejo esse tipo de cobertura de acroporídeos desde o final dos anos 1970 ou início dos anos 1980. É bem impressionante”, afirma Mark J. Butler IV, professor e pesquisador da Old Dominion University, nos Estados Unidos, um dos muitos visitantes que foram admirar o próspero mundo subaquático do recife restaurado.

O branqueamento de corais está se tornando mais extremo a cada ano devido às mudanças climáticas e às tempestades mais frequentes e severas.

Mas se ela tivesse esperado emissões zero para começar seu trabalho, o recife hoje poderia parecer não muito mais vivo do que depois que foi atingido pelo furacão Iris.

Assim, enquanto muitos acadêmicos ainda criticam a ideia da restauração de recifes em um mundo de aquecimento dos oceanos, o declínio constante dos recifes em todo o mundo levou a projetos do tipo em mais de 50 países — embora nenhum ainda se aproxime da dimensão ou longevidade do trabalho realizado em Belize.

Por G1

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Trajano Xavier

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