Projeto une produção de alimentos e restauração do Cerrado
Considerado a savana mais rica em biodiversidade do mundo, o Cerrado já perdeu 50% da sua vegetação original. Para tentar frear essa destruição, uma iniciativa atua para restaurar o bioma e fortalecer comunidades tradicionais e agricultores familiares que vivem nesse território. Trata-se dos chamados SACIs (Sistemas Agrocerratenses Inclusivos), que têm foco na produção de alimentos com o uso de técnicas e metodologias de restauração com espécies nativas do Cerrado.
A ação é coordenada pela Rede de Pesquisa e Extensão do Cerrado da RIDE DF (Rede PequisAção); Articulação pela Restauração do Cerrado (Araticum) e Ação RIDE SAN DF+, com apoio e participação do WWF-Brasil. Para as famílias envolvidas, os benefícios são o aumento da produção e geração de renda.
“Temos a possibilidade de construir agroecossistemas voltados para a nossa realidade, no bioma onde estamos inseridos, que é o nosso Cerrado, e o ponto de vista de uma restauração que tem preocupação social também. É mostrar para os nossos camponeses que existe a possibilidade de restaurar e ajudar na questão produtiva. É um leque de possibilidade que os SACIs estão nos dando”, afirma Ronei Rodrigues, do Assentamento Estrela do Norte, em Montes Claros (MG), um dos participantes das oficinas do projeto.
Semelhante aos SAFs (Sistemas Agroflorestais), que por vezes usam espécies exóticas como o Eucalipto para a produção, os Sistemas Agrocerrantes utilizam espécies nativas, como capins, árvores, ervas e arbustos. Outra técnica utilizada é a semeadura direta, ou muvuca, como é popularmente conhecida, que mistura e semeia diversas espécies nativas no solo, visando deixar o sistema ainda mais adequado ao Cerrado, desempenhando as funcionalidades da savana tropical.
Para a bióloga Ana Clara Nunes Amorim, diretora-presidente da Pequi (Pesquisa e Conservação), organização parceira do projeto, a iniciativa resulta em vantagens ecológicas, como o retorno da água. “Essa metodologia é preparada para ser mais produtiva a longo prazo, oferecendo a oportunidade dos produtores se vincularem com esses sistemas, baseados em espécies agronômicas que eles já se produzem. É uma excelente alternativa econômica.”, afirma.
Mão na massa
Para colocar o projeto em prática, primeiro foram implementados 3,5 hectares com as técnicas dos SACIs em áreas de terra de famílias de agricultores dos assentamentos da Reforma Agrária do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, Oziel Alves III e Roseli Nunes, em Planaltina, Distrito Federal, com o apoio do Instituto Federal de Brasília, Núcleo de Agroecologia UnB/CDS/Nexus, NEA Candombá e Tikré Brasil.
Os plantios fizeram parte de uma oficina de aprendizados e contaram com a participação de representantes de outros assentamentos de 4 estados (Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais). Os representantes estiveram em Brasília para participar dos plantios e no segundo momento do projeto retornaram aos seus estados para implementar as técnicas e conhecimentos adquiridos durante o encontro no DF.
Um dos participantes da capacitação foi o agricultor Peterson Fernando, de Mato Grosso do Sul, que tem aprendido muito no processo. “Por conta do avanço do agronegócio, a maioria das áreas de Cerrado no meu estado estão sendo derrubadas para plantar soja, há saída de uma biodiversidade enorme para um cultivo de monocultura que não produz comida. Por isso, esse projeto é muito importante. Eu nunca me imaginei plantando Cerrado e estou animado”, afirma.
O analista de conservação do WWF-Brasil, Vinícius Barbosa Pereira, reforça a possibilidade de crescimento do SACIs. “Essas articulações promovem visibilidade e conhecimentos sobre restauração para o bioma e a sua implementação em unidades demonstrativas neste momento e poderá, no futuro, ganhar escala e fazer o futuro que almejamos tornar-se realidade casando restauração, comida e renda”, destaca.
O Cerrado brasileiro é considerado a savana mais rica em biodiversidade do mundo e é responsável por recursos básicos para a vida. E vida é um aspecto valioso, além de inúmeras espécies da fauna e da flora, aproximadamente 25 milhões de pessoas vivem no Cerrado, o que representa 12% da população nacional, entre elas os povos e protagonistas do bioma e seus valores.
Em 2021, foi iniciada a Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas, que segundo a ONU é “um apelo para a proteção e revitalização dos ecossistemas em todo o mundo, para o benefício das pessoas e da natureza”. O movimento global tem o objetivo de acelerar a restauração e incluir articulações necessárias e iniciativas de campo nessa temática.
Fonte: WWF